Arrendamento x Parceria Rural: diferenças jurídicas que impactam o bolso e a gestão no agronegócio

Arrendamento x Parceria Rural: diferenças jurídicas que impactam o bolso e a gestão no agronegócio

No agronegócio, escolher entre arrendamento e parceria rural não é mero detalhe burocrático: é decisão que influencia diretamente quem assume o risco, como é feita a remuneração e quais direitos cada parte terá em caso de conflito.

Mais do que o nome do contrato, o que realmente vale é a sua essência econômica. Entender essa diferença é o que evita litígios caros, surpresas tributárias e perda de oportunidades na gestão da propriedade.

Arrendamento x Parceria: por onde começa a diferença?

No arrendamento rural, o proprietário cede o uso do imóvel para exploração agropecuária mediante pagamento de valor certo, normalmente em dinheiro, por prazo ajustado. Em regra, é o arrendatário quem assume o risco da atividade.

ArrendamentoDescriçãoBase legal
Retribuição Certa (Fixa)A regra geral é que o pagamento seja em dinheiro, sendo vedado o pagamento em produtos ou frutos. Admite-se o uso de produtos/frutos apenas como indexador.Art. 18 do Decreto nº 59.566/66
Risco produtivo do arrendatárioO risco da atividade rural (perda dos frutos, intempéries, variação de preços de mercado, produtividade etc.) recai predominantemente sobre o arrendatário, que assume o risco econômico da exploração.Construção doutrinária e jurisprudencial sobre a natureza do arrendamento rural.
Referências legais relevantesRegulado principalmente pelo Estatuto da Terra e seu regulamento, que disciplinam forma, limites, prazos, remuneração e direitos/deveres das partes.  Lei nº 4.504/64 (Estatuto da Terra), especialmente art. 95 e seguintes; Decreto nº 59.566/66.

Já na parceria rural, o proprietário e o parceiro-outorgado dividem resultados e riscos da produção. Cada um entra com recursos (terra, trabalho, insumos, gado, máquinas etc.) e a remuneração é um percentual dos frutos ou lucros, dentro dos limites legais.

ParceriaDescriçãoBase legal
Partilha de frutos/lucros e riscosA remuneração é variável e depende do resultado da atividade. Há partilha obrigatória dos riscos do empreendimento (clima, pragas, mercado) e dos frutos ou lucros obtidos.Elemento distintivo da parceria rural em relação ao arrendamento (em que o risco recai, em regra, no arrendatário).
Contribuições compartilhadasCada parte contribui com recursos (terra, trabalho, insumos, capital, máquinas etc.), e os resultados são divididos de acordo com a proporção ajustada em contrato, considerando a contribuição de cada participante.Relevante para definir a porcentagem de cada parceiro e evitar desvirtuamento da parceria para arrendamento disfarçado.
Limites máximos à cota do parceiro-outorganteA legislação impõe limites ao percentual que o proprietário (parceiro-outorgante) pode receber, justamente para assegurar a partilha efetiva de riscos e resultados e proteger o parceiro-outorgado.Estatuto da Terra e Decreto nº 59.566/66 estabelecem limites máximos de participação do parceiro-outorgante.

Diferenças que realmente mudam o jogo

Em termos práticos:

Arrendamento

A remuneração é um preço fixo, pré-estabelecido, que independe do sucesso ou insucesso da lavoura ou criação. O arrendatário assume quase a totalidade dos riscos produtivos e de mercado.

Parceria rural

A remuneração está atrelada a um percentual dos frutos, produtos ou lucros, portanto, variável. Parceiro-outorgante e parceiro-outorgado compartilham os riscos do empreendimento na proporção de suas contribuições e da partilha dos resultados, além disso, a legislação ainda traz limites objetivos para evitar abusos na parceria.

Dois produtores rurais apertando as mãos em acordo no campo, representando contratos de arrendamento e parceria rural.
No campo, a clareza do acordo vale tanto quanto a produtividade. Entender a diferença entre arrendamento e parceria rural é o que garante segurança para ambos os lados.

Prazos, preferência e proteção

No arrendamento, a lei garante prazo mínimo e direito de preferência na renovação do contrato e na compra do imóvel em caso de venda. Esse direito é protegido pela legislação agrária e é considerado irrenunciável. A proposta de venda deve ser comunicada formalmente ao arrendatário, que terá prazo para decidir se exerce ou não a preferência.

Na parceria rural, a lei não confere ao parceiro-outorgado o mesmo direito legal de preferência. Se as partes quiserem estabelecer algum tipo de preferência na renovação ou na compra do imóvel, isso precisa ser previsto expressamente no contrato e bem desenhado, para não gerar falsa sensação de segurança.

Quando a “parceria” vira arrendamento (e o problema começa)

Na prática, muitos contratos chamados de “parceria” acabam sendo reconhecidos como arrendamento na Justiça quando: i) a remuneração é, na prática, fixa, ainda que expressa em produto e ii) o risco recai quase integralmente sobre quem explora a terra.

Os tribunais olham menos para o nome do contrato e mais para a realidade econômica da relação. É aí que um contrato mal estruturado pode ser requalificado, trazendo efeitos jurídicos e econômicos que ninguém planejou.

Fechando a porteira: por que isso importa agora

Em contratos agrários, algumas cláusulas são decisivas para reduzir risco de litígio:

  • definição clara do objeto e da área;
  • regras de remuneração compatíveis com a modalidade (arrendamento ou parceria);
  • distribuição de custos e riscos da atividade;
  • tratamento das benfeitorias;
  • regras de preferência e notificação;
  • mecanismos mínimos de fiscalização;
  • critérios para rescisão e entrega da área.

A partir desses pontos, e de outros ajustes finos conforme o caso concreto, é possível estruturar um contrato muito mais seguro e alinhado ao interesse das partes.

Conclusão

Em resumo, arrendamento e parceria rural não são apenas formas diferentes de explorar a terra: eles distribuem riscos, resultados, direitos e tributos de maneiras completamente distintas.

Um contrato mal desenhado pode ser requalificado em juízo, gerar custo inesperado e comprometer a segurança patrimonial. Por isso, mais do que um modelo pronto, cada produtor ou proprietário precisa de um instrumento que reflita a realidade da sua operação e os riscos que está disposto a assumir.

Se você já utiliza contratos de arrendamento ou parceria, ou está pensando em ajustar a forma de exploração da sua área, vale revisar esses instrumentos antes da próxima safra.

Autores

  • Henrique Borges Rodrigues

    Advogado do Gomes Altimari Advogados
    Atuação no agronegócio, contratos e societário

  • Tulio Barros

    Sócio do Gomes Altimari Advogados
    Atuação em contratos, societário e compliance