Menos área plantada, porém, mais produtividade. Estas são as projeções para a safra de trigo 2019/2020, segundo dados da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento). De acordo com a instituição, a área plantada do grão no Brasil deve sofrer uma redução de 3,3%, caindo de 2,06 para 1,9 milhão de hectares.
Entretanto, caso as condições climáticas sejam favoráveis, a produtividade deverá sofrer um aumento, subindo de 5,3 para cerca de 6,1 milhões de toneladas.
Os números vão de encontro com a estatística do Conselho Internacional de Grãos (IGC), que ajustou projeções acerca da safra global de trigo para 769 milhões de toneladas, frente aos 733 milhões da safra anterior. Tudo indica que a produção de grão atingirá patamar recorde, superando os números do ano passado.
As altas expectativas vêm em boa hora, já que produtores da região sul, principalmente do Paraná, que responde por 50,06% da área de plantio do grão e quase 70% da produção, têm sofrido constantes revezes com o clima. Nos últimos anos, a seca contribuiu para uma colheita abaixo do esperado e diminuição da qualidade e produtividade, gerando um ambiente generalizado de desânimo entre os produtores rurais do grão.
Alguns fatores são primordiais para o sucesso da colheita, outros, influenciam diretamente na receptividade do grão:
Cotação do dólar
Parece estranho que uma moeda estrangeira esteja tão interligada com a agricultura brasileira, mas isto se dá porque os insumos (fertilizantes, maquinários, defensivos agrícolas, sementes) são, em sua maioria, adquiridos de empresas internacionais, que cobram em dólar. Nas últimas safras do trigo, este foi um dos problemas que levou à queda na competitividade. Oscilações do dólar levaram o agricultor a investir em insumos na alta e vender a colheita na queda da moeda, resultando em lucros menores.
Com a elevação na cotação da moeda norte-americana, o cenário para a safra 2019/2020 melhora. Espera-se que as empresas de moagem passem a dar mais atenção à produção nacional em detrimento das commodities vindas do exterior. Caso aconteça, as consequências em curto prazo são a valorização dos agricultores com melhores remunerações.
Planejamento e investimento
Pelo menos um mês antes da semeadura do trigo, é necessária uma avaliação do solo para que sejam feitas as devidas correções. Segundo dados da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuaria), 25% do sucesso da colheita depende da correta adubação e fertilização do solo, uma vez que o aumento de produtividade e a qualidade dos grãos estão diretamente ligados à absorção de nitrogênio proveniente destes insumos.
É importante realçar também que o setor agrário vem enxergando com bons olhos o Plano Safra para o ciclo 2019/2020. O projeto irá contar com um aporte de R$ 222,4 bilhões para que os agricultores invistam em custeio, investimento e comercialização. Destes, R$ 18,28 bi será voltado à Agricultura Familiar com taxas de 3% a 4,6%; R$ 23,77 bilhões para os médios produtores, com taxas de 6% ao ano; e 50,69 bilhões para os grandes produtores, com 8% ao ano de juros.
Clima favorável
O trigo demanda temperatura e umidade do ar baixas, pouca chuva, solos profundos e com boa drenagem, além da quantidade certa de nutrientes no solo e pH elevado. No primeiro ciclo, chuvas e até mesmo geadas são bem-vindas, mas estas se tornam perigosas no momento em que o grão começa a se formar, pois favorecem o processo de florescimento do mesmo quando ainda na espiga, afetando a produtividade e a qualidade.
De olho nas doenças
O volume de chuva acima da média contribui decisivamente para o desenvolvimento de ervas daninhas, pragas e fungos, considerados os maiores inimigos das safras de trigo. No cerrado, por exemplo, o plantio de trigo tem sofrido com o aparecimento de manchas e queimas nas folhagens, com rápido alastramento. Isto só é possível devido à umidade que favorece a ocorrência de doenças nas lavouras, não só de milho, como de soja, sorgo e feijão.
Para enfrentar problemas relativos às doenças, são utilizados os defensivos agrícolas, além de um rigoroso controle biológico para compreender e tratar adequadamente as possíveis fitopatologias. Além disso, pesquisadores agrários vêm desenvolvendo anualmente cultivares mais resistentes.
Essas variações de trigo, que geralmente passam por melhoramentos genéticos, são cada vez mais aceitas e absorvidas pelo mercado.
A hora da colheita
O agricultor não pode deixar passar a hora certa da colheita, sob risco de perder a qualidade dos grãos. Geralmente, o estágio final de maturação dos grãos se dá em meio a um período excessivo de chuvas, portanto, há duas opções: a realização da colheita antes da precipitação e realização de secagem ou quando atingem 13% de umidade, momento que é considerado apropriado para que não haja muitas perdas.
Aproximadamente 15% da safra de trigo 2018/2019 colhida no Paraná estava em péssimas condições devido a variações bruscas no clima.
Para que não perdessem o investimento, os agricultores não tiveram outra escolha a não ser vender para indústrias de rações.
Questões políticas
Em março, o presidente Jair Bolsonaro fechou um acordo com o presidente norte-americano Donald Trump para importação de 750 mil toneladas de trigo do país sem cobrança de taxas alfandegárias. Segundo a Conab, o consumo interno de trigo e seus derivados é de cerca de 11 milhões de toneladas. Como a produção nacional beira as 6 milhões de toneladas, é necessário um aporte externo do grão por meio de importações, um mercado que era de domínio argentino.
O novo acordo, que posteriormente foi estendido a outros produtores do grão que desejam competir no mercado brasileiro, como Canadá e Rússia, favorece os Estados Unidos pela sua capacidade de produção elevada e alta competitividade frente aos outros países. Politicamente falando, a situação estremece as bases do Mercosul.
Questões econômicas
Outra situação ocorrida nos últimos dias e que pode afetar bruscamente o preço da safra de trigo 2019/2020 diz respeito ao acordo Mercosul-União Europeia, que prevê, a curto prazo, a eliminação de tarifas para itens essenciais para a agricultura. A importação de trigo e seus derivados é uma das contrapartidas solicitadas pela UE no acordo entre os dois blocos econômicos, o que pode impactar diretamente os preços da commodity.