Pecuarista, com certeza você já se deparou com problemas relacionados às clostridioses no seu rebanho, talvez sem nem mesmo ter a certeza a respeito de qual doença estava lidando e, possivelmente, esses quadros levaram a impactos bem negativos na cadeia produtiva de forma geral.
Mas o que é uma clostridiose? É o quadro clínico observado a partir da multiplicação de algumas espécies patogênicas da bactéria Clostridium. Ao conhecer melhor o grupo que compõe as clostridioses – que estão presentes por toda parte – é bem mais fácil ter maior controle na prevenção desse quadro clínico no gado.
A seguir, entenda mais sobre quais as principais doenças que compõem as clostridioses e quais os sintomas mais observados. Também abordaremos os meios de prevenção para reduzir ao máximo os danos e as perdas decorrentes dessas doenças. Confira!
Principais clostridioses
O termo genérico “clostridioses” abrange um grupo de bactérias anaeróbias do gênero Clostridium. Algumas espécies são encontradas normalmente no trato digestivo ou no ambiente e existem variedades da bactéria com alto impacto letal.
As Clostridium sp. contam com cerca de 100 espécies que, em sua maioria, coexistem com os animais normalmente. As variedades letais, especialmente em sua forma de resistência, ou seja, de esporos, chegam a causar sintomatologia clínica bem séria, com redução da capacidade produtiva e reprodutiva, chegando até a morte súbita.
Para fins didáticos, saiba que existem grupos definidos de acordo com os sintomas causados e os sistemas afetados. São eles:
- Neurotrópicas: C. botulinum, C. tetani;
- Histotóxicas: C. chauvoei, C. septicum, C. novyi tipos A, B, C, C. sordellii e C. haemolyticum;
- Enterotoxêmicas: C. perfringens tipo A, B, C e D.
Uma vez destacado as principais espécies do gênero de alto potencial letal da Clostridium, vale a pena relacionar também as principais doenças em decorrência dessas bactérias:
- Botulismo e tétano;
- Carbúnculo sintomático, edema maligno, hemoglobinúria bacilar;
- Enterotoxemia.
Leia também: Doenças bovinas: sintomas, tratamentos e prevenção.
Principais riscos das clostridioses
Dentre a diversidade do gênero que engloba todas as clostridioses, cerca de 10% tem alta patogenicidade. Conforme elencamos, as toxinas e lesões que aparecem nos órgãos e tecidos dos animais contaminados é que vão definir a nomenclatura do grupo.
A contaminação do indivíduo ocorre por ingestão ou através de feridas expostas. Na grande maioria dos casos, o microrganismo coloniza algum tecido do animal e produz ali as suas toxinas. A partir daí, há a percepção dos sintomas característicos.
Com isso, o principal risco das doenças está na sua forma de manifestação. O acometimento ocorre de forma isolada, mas comumente se manifesta na forma de surtos ou epidemias, o que leva ao comprometimento de muitos animais no mesmo rebanho, invariavelmente trazendo grandes prejuízos.
De modo geral, esses surtos têm relação direta com fatores predisponentes em resultado de um manejo despreparado, calendário de vacinação desatualizado, aplicações inadequadas (muitas vezes com uso de equipamentos contaminados), suplementação mineral irregular, acesso à fontes de água ou materiais impróprios para o consumo, entre outros descuidos.
Fique atento aos quadros de clostridioses
Evidentemente, as clostridioses definem-se como um grupo de doenças e os sintomas se relacionam com o quadro de cada espécie do gênero Clostridium. Dessa forma, observe os principais sintomas de cada clostridiose:
Botulismo
Decorre da ingestão das neurotoxinas e, uma vez infectado, o sinal clássico é a paralisia da musculatura esquelética, ou seja, do corpo todo. Por ser uma bactéria anaeróbia estrita, está presente principalmente em ambientes putrefativos. A toxina pode estar em corpos em decomposição, especialmente nas estruturas ósseas, assim como em águas paradas e no solo.
A deficiência mineral estimula os animais a procurarem suprir essa necessidade, e a osteofagia nesses casos passa a ser comum. Além disso, bebedouros que não recebem atenção adequada são propícios para o desenvolvimento dos esporos.
A ação é direta no sistema nervoso e observa-se paralisia flácida progressiva, decúbito external ou lateral e rápida evolução. Grande dificuldade para engolir, sialorreia e dificuldade respiratória.
Com o avanço da doença há parada respiratória e dos movimentos do trato digestivo e, em sequência, a morte do animal, caso não se inicie o tratamento rápido com aplicação de soro antibotulínico.
Essa doença também representa grande risco à saúde humana e pode estar presente em alimentos em conserva feitos sem os devidos cuidados.
Tétano
Essa já é uma doença infecciosa não contagiosa que provoca especialmente rigidez muscular, orelhas eretas, timpanismo, dificuldade de locomoção, contrações e dificuldade para abrir a boca.
É muito mais comum em equinos e ovinos, mas seja qual for a espécie acometida, para ocorrer a infecção é necessário que haja uma porta de entrada para contaminação dos esporos, por isso, é fundamental a presença de uma ferida, e os sintomas costumam aparecer entre 7 e 15 dias após o contato inicial.
O diagnóstico é baseado no histórico do animal, associado aos sintomas, e para tratamento aconselha-se a limpeza e debridamento da ferida e promover o relaxamento muscular do animal. O uso de toxina antitetânica e antibioticoterapia é também indicado nesse caso.
Ademais, tenha em mente que a prevenção é o melhor caminho, especialmente considerando a criação de outras espécies na mesma propriedade.
Veja também: Boas práticas na sanidade do gado.
Carbúnculo sintomático
Essa infecção não contagiosa acomete os bovinos e a característica principal pode se resumir em manqueira ou mal do ano. Tem difícil controle, pois se trata de uma doença causada por um agente amplamente distribuído no ambiente de forma geral, o que facilita a contaminação dos animais que muitas vezes estão com condição nutricional boa.
A partir da ingestão dos esporos, estes migram para a porção muscular e geralmente o local afetado apresenta inchaço e sensibilidade de aspecto frio e com crepitação ao toque. Não raro, ocorrem mortes súbitas.
Os animais ainda podem apresentar tremedeira, febre, apatia, claudicação acentuada, perda de apetite, pulso rápido, inchaço muscular e respiração pesada.
O tratamento é feito a partir de antibioticoterapia, porém a maior parte dos animais afetados morre e os surtos são complicados de prevenir, por se tratar de um agente muito presente no ambiente.
Gangrena gasosa ou Edema maligno
Caracteristicamente, a infecção por essa espécie do Clostridium leva a quadros de necrose tecidual. Mais comumente, na gangrena gasosa a evolução é rápida e aguda, o que pode levar a morte entre 24 e 48 horas, e as lesões são no tecido muscular com formação de bolhas gasosas.
Já em casos de edema maligno, se observa inflamação dos tecidos subcutâneos, então a partir da produção das toxinas, se observam gases nesses tecidos, o que leva a edema subcutâneo e crepitação ao toque.
De qualquer maneira, a entrada do agente se dá por meio de feridas na pele, comuns nas castrações e até por meio da vacinação com equipamentos contaminados. Sendo assim, a atenção nesse sentido é fundamental.
O tratamento também está baseado no debridamento do tecido necrótico e uso de antibióticos de amplo espectro em doses agressivas, porém o sucesso nesse caso é bem raro, por isso, o recomendado é a vacinação em dia e uso de utensílios sempre estéreis.
Hemoglobinúria bacilar
A infecção leva a evolução em necrose hepática e os esporos estão presentes no ambiente através de inundações, fezes de animais contaminados, feno contaminado e mal conservado e até carcaças de carnívoros. A partir da ingestão dos esporos, em condições de anaerobiose há formação de toxinas que levam a necrose tecidual.
Um dos sinais mais característicos é a hemoglobinúria, além de depressão, anorexia, icterícia e dor abdominal. A ação é muito rápida no organismo dos animais afetados.
O diagnóstico está na associação da história e evolução clínica, caracterização do ambiente que esse animal vive, já que nesse caso as bactérias estão bem presentes em áreas de baixo relevo e alta umidade.
Devido as características, realizar o exame diferencial para babesiose é interessante, além de rápida medida de antibioticoterapia de amplo espectro, sendo realmente eficaz apenas as vacinações em dia.
Enterotoxemia
Nesse caso, o quadro clínico está diretamente relacionado com o trato digestivo, complicando em nível de toxemia sistêmica, inclusive com sinais neurológicos, afetando especialmente os animais mais jovens. Alterações intestinais em decorrência da alimentação dos animais podem resultar em maior proliferação e replicação dos esporos que liberam as toxinas.
O quadro é bem complexo e diversos órgãos são comprometidos, como rins, rúmen, pulmão, ceco e colón. A partir daí, pode-se verificar apatia, desidratação, anorexia, dores intensas na região abdominal, diarreia sanguinolenta aguda e morte, em geral, de ocorrência súbita.
O diagnóstico se baseia na epidemiologia e a partir da necropsia e isolamento da bactéria em alta quantidade. Nesse caso, o controle eficiente esta no calendário de vacinação em dia, desde a tenra idade dos bovinos e contactantes.
Abaixo, disponibilizamos uma tabela com informações sobre os grupos das clostridioses, espécies das bactérias, nome da doença, quadro clínico, tratamento e prevenção recomendados.
A prevenção é sempre o melhor remédio
A vacinação regular do rebanho, associada aos cuidados básicos de prevenção e ao monitoramento constante dos animais, é a melhor saída para prevenir surtos e epidemias das clostridioses.
Como os quadros clínicos têm rápida evolução, os tratamentos podem não ter um efeito positivo, além do fato de que a maioria das vezes os surtos comprometem parte do rebanho e não indivíduos isolados, o que gera maior comprometimento financeiro.
Portanto, a melhor forma de evitar sofrimento desnecessário do rebanho e prejuízos produtivos, sem dúvidas, é instituir medidas de prevenção.
Medidas de prevenção
Praticar a mudança de atitude na propriedade, tendo em vista prevenir problemas maiores, deve incluir uma série de cuidados que são simples, mas devem ser contínuos:
- atenção aos equipamentos que devem ser de boa qualidade;
- equipamentos desinfetados sempre;
- cuidado com a limpeza dos cochos e bebedouros;
- armazenamento inadequado de alimento é outro grande foco de risco;
- o espaço precisa de cuidados, especialmente se já houve surtos de clostridioses, já que os animais portadores podem eliminar os esporos no ambiente;
- animais com sinais clínicos precisam ser apartados dos demais para receber os cuidados necessários;
- evitar o uso de materiais perfurocortantes em instalações;
- descarte em locais apropriados seus animais que vêm a óbito: o mais longe possível do rebanho, em vala com cobertura ideal.
Confira, no vídeo abaixo, a importância da prevenção:
Confira também: Mastite bovina: aprenda como identificar e prevenir a doença.
Por que é importante conhecer mais sobre as clostridioses?
Conhecer melhor essas doenças é fundamental para a realização da prevenção e controle. Sendo assim, é necessário seguir as recomendações e ter cuidado em treinar e orientar o pessoal responsável pelo manejo e trato dos animais.
Além de tais medidas, é sumariamente importante realizar a correta vacinação contra as clostridioses em todos os seus animais. Essa medida sim é a base para o controle das doenças na propriedade.
Quanto às vacinas e o esquema vacinal, a orientação do médico veterinário é super importante, pois ele vai considerar questões como a região, o histórico produtivo, a idade predominante do rebanho e o foco produtivo e reprodutivo.
Além disso, existem versões de vacinas monovalentes, que conferem proteção para apenas um tipo de agente ou ainda, a versão polivalente, que é a mais utilizada, já que protege o rebanho contra variedades diferentes de clostridioses. Portanto, fique atento e saiba quando vacinar seus animais.
Abaixo, preparamos um infográfico com uma sugestão de esquema de imunização, respeitando a idade e ambiente em que vivem os animais. Lembrando que já existem fármacos que abrangem a profilaxia de mais de uma espécie de Clostridium.
E então, este artigo foi útil para você? Aproveite e acesse também nosso post sobre doenças respiratórias em bezerros. Boa leitura!